quarta-feira, 13 de maio de 2015

Ária de coração solitário

Boulevard Montmartre At Night - Camille Pissarro

















Eu amo, sim, mas não mais,
Por ser amor a dor que eu sinto
Dentro do compasso de meu peito em chaga.
Por isso o amor, eu posso amar,
Mas não mais...

Sinto, sinto imensamente a vida ao meu redor,
Sinto o cheiro do café passando,
Sinto o cheiro acre das flores murchas
Por sobre a mesa empoeirada
Que nunca mais suas mãos sentirão.

Eu amo, sim, mas não mais.
Não mais a cor será a mesma,
Das paredes do nosso quarto;
Eu penso, e o pensamento me é caro,
Como o valor sentimental de um objeto antigo.

Mas o amor me é caro,
Imprescindível sensação da vida,
Sensação de morte, porém o coração ainda bate,
As veias e artérias pulsam
E mesmo em um minúsculo corte
A superfície recobre-se de tinta rubra
De muita qualidade para a pena e o papel
De um dolorido poema moribundo.

Meu coração desolado, solitário e murcho,
Ama:
Como sempre amou,
Como há de amar,
Mas não mais...

Ele sente a chama opaca de volúpia,
O sexo embebido de líquidos lubrificantes,
O odor do cio.
Ele sente o rubor da libido,
Ele simplesmente vive.

Mas na ária de coração solitário
Ele canta o amor,
Pois eu amo, sim, mas não mais...

Por isso digo o adeus eterno, para não mais estar
Onde nunca eu deveria ter estado.


(12/05/2015 – Ijuí)

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