terça-feira, 31 de março de 2015

Atitudes de um poeta maldito


     












     A Estêvão DeLarge, meu amigo

Andei por entre ruas de enorme escuridão,
Topei com anjos negros, de garras e dentes afiados,
Perfilados em minha frente
Tapando a passagem.

Negligenciei meus próprios estímulos e instintos,
Sofri as calamidades da solidão e da angústia.

Disse, a mim mesmo, que o dia é nostálgico,
Que a noite, sempre enorme, é a minha casa.
Em qualquer lugar uma moça pare um menino:
Ou o jogará no contêiner de lixo,
Ou o venderá no mercado negro
Para um possível ritual de bruxaria.

Mas eu mesmo estive na imensidão de um cemitério.
Busquei, às sepulturas, todos os tipos de epitáfios:
Cantei, gritei e senti a dor de estar no silêncio eterno.

Quebrei a voz, medi meus dentes e rasguei a carne...


(31/03/2015 – Santa Maria)

sábado, 28 de março de 2015

Caminho-velocidade

A Cabeça - Santa-Rita Pintor



















O caminho;
Os desvãos do caminho, dentro da flora,
São tortuosos e mortais:
Passemos por eles, então.

O que devemos preferir dentro da mente, em densidade
                                                  [suprema,
Para conduzir-nos além?
O convívio com o profano da foz, da voz, desse sonido que
                                [retine em nossos tímpanos.
Nada se cria com passadismos.
O mundo dos sons, do vozerio que, rrrrruuu, urra com a
                    [força contida em seus pulmões poluídos
De fumaça de fábricas e automóveis.

Por dentro a poesia se concretiza,
Mas é ao exterior que sempre será suprema.

A força de tração dos automóveis,
O grito das correias dentro das plataformas de utilidade da
                            [infantaria naval e aeronáutica
Fazendo com que os grandes jatos e navios de tamanhos
                                               [descomunais
Deem vigor, ainda mais, à força bélica do país
Tomando, à guerra, a atitude de higienização prática da
                                                [sociedade.

Não temamos, companheiros, as forças superiores que vêm da
                                                  [máquina,
O avanço convulsivo dos artefatos que nos dão praticidade:
E sons fortes.
Não temamos.

Continuemos a praticar nossas ações, mesmo que supérfluas.
Nem tudo é arte,
Mas a arte está em praticamente tudo;
E o nada é que completa o interior do poeta.

Não sei da Vida,
Não sei da Sina.
Só sei da Força,
Da Velocidade
E da Euforia.

Uma Euforia mista com Agonia: de ter carapaça limitada,
                                                 [contendo,
No interior,
A ilimitada vontade de viver a velocidade do passar do
                                                    [Tempo.


(28/03/2015 – Ijuí)

segunda-feira, 23 de março de 2015

A dor que deveras sente















A pura chama do coração
de dor está repleta.
Contudo a vida continua
deserta.

Duras penas, mais pesares,
a inaptidão grudenta
da crua aflição da vida
fermenta.

Mas o coração batendo
com certa dor pungente
bate mais descompassado,
demente.

E a dor de estarmos nus
em estado de aberração
cantamos a ardência da vida:
aflição.

Então, o poeta é um fingidor
que, mesmo quando não sente,
usa, na poesia, a dor
profundamente.

(23/03/2015 – Ijuí)

sábado, 7 de março de 2015

Futuro insano de uma mente poeticamente comum













Por entre a densa vegetação vive o tempo passado
Que, com seus meticulosos tentáculos, alicia a mente para nela depor memórias:
Artefatos que conduzem o Homem à funesta morada da estagnação evolutiva.
Minhas artérias levam o sangue-tinta ao tinteiro do irrestrito
Esta mansão de tijolos e concreto, com aparelhagem elétrica e motivos de usar um bastão de plástico para mudar os canais de um televisor
Que logo-logo será ativado a partir dos sonidos de nossas pregas vocais.

Se me cabe um desejo, este que eu tanto almejo em minha mente,
Poder olhar para trás sem sentir angústia, mover os olhos da memória e ser levado em direção de um locus que será de melhor viver,
Mas a loucura está na visão do passado. Queimem os retratos,
Aticem o fogo contra as paredes repletas de escamas de papel tingido sem nenhum significado,
Que deixemos de usufruir de antigas palestras, que sejamos capazes de progredir unanimemente para o estado elétrico-corajoso-destemido
Causando aos olhos de outros seres humanos o estranhamento primordial de um futuro sobreposto ao tempo de agora, pois o presente agora já se foi
Dando espaço-vantajoso para um novo viver.

E onde se encontra a profundidade do rio que passa; nesse rio em que nunca nos banharemos nas mesmas águas?
E a cólera, profundidade mestra, de uma mente insana, que, poeticamente, banha-se em todas as águas: água que forma o rio, rio que move roda, roda que cria energia, energia que gera a luz elétrica, a luz elétrica que ilumina a noite, a noite que nos faz dormir quando não se tem luz elétrica;
Mas, meus camaradas, não queiram dormir,
Dormir é a atitude mais estúpida, e a pergunta primordial é:

— VIVER OU MORRER? —, a questão é esta.

Então, na magnífica fábrica de utensílios mecânicos de ignição elétrica
Mora o desejo de se sobrepor aos maiores riscos de um dia a máquina dominar o Homem:
MÁQUINA + LIBERDADE = REVOLTA > HOMEM-INVENTOR.


(07/03/2015 – Ijuí)

quarta-feira, 4 de março de 2015

Certa loucura de cantar o grito




















A mão no limbo.
O ritmo,
a cadência em tons agudos.
O ar límpido, de se
respirar fundo.
O rio é fundo,
a voz,
o sopro,
o som.

A loucura de
cantar o grito,
a profunda ferida em
nódoas de sangue,
o devaneio
do lugar comum,
a mente,
mais que inteligência
é a arte de se estar
no mesmo,
mesmo não
estando.


(04/03/2015 – Santa Maria)