terça-feira, 30 de julho de 2013

EXCESSOS

Posso ser insano o suficiente e comparar-te
Às deusas gregas, mesmo sabendo
Que estas divindades mitológicas
Profanam a tua imagem em teu altar de mármore
Marfim e diamantes de minha mina preciosa.

Posso ser insano o suficiente e classificar-te
Sendo que tu, ó ser sumarento e luminoso
Que de tua carne emana a minha vida e o líquido
Divino (néctar) que me faz mais forte e sobre-humano
Sendo que semideuses na minha ignorância e na minha falta
Fazem nada além de existir ou não no meu dialeto mundano.

Posso ser insano o suficiente e deformar-te
Com classificações variadas e comparações estúpidas.
E dito seja, que tu, luz superior dos meus dias
Trevas do meu sentido e do meu sono
Glória chegada em minha morte, não temas
Pois, para mim, o ser supremo está no céu
Mas nossa forma divina está uma parte no meu peito
E a outra parte está no teu, sendo que nem mesmo a morte
Amiúde repousar em nossos pastos ou céu escurecer
Findará a nossa história. E que seja doce o nosso encontro
No nevoeiro impreciso de um destino fabuloso.


(30/07/2013 – Santa Maria)

domingo, 28 de julho de 2013

MONSTRO SANGUINÁRIO

Eis que surge ante os umbrais de minha porta
Um ente vindo de um lugar do inferno, algo sobrenatural.
Formas vis de rato alado, preto, que está contente nas carnificinas
De todos os tempos, de todas as eras. E esse ser sanguinário
Há de beber todo meu sumo celular, e todo meu líquido vital.

Eis aqui um morcego, vindo das profundezas da lava dos tempos
E de todos os homens, no íntimo do momento, no terror
De cada gesto fecundo de impaciência e ignorância. Medo.
Um medo sobrecarregado de sentidos contidos no ímpio.
E se todos os gestos que esse ser fazia, batendo suas asas
Entoando seus dizeres de animal, eu os tentava entender.
Mesmo que pelo terror da hora, eu, logo a sua vida tentei.
E na primeira decida de minha clava, esse morcego não se foi
Pois, com o fracasso da primeira, tentei pela segunda vez a sua vida
E, na segunda descida da clava forte, a vida desse ser se esvaiu.

Mas nunca na vida esquecerei-me da aventura noturna, em que bebia do vinho
E que me surgira ante os umbrais da porta um ente vindo de outras eras.

Eis que foi o meu primeiro contato com a morte e suas carnificinas.


(28/07/2013 – Santa Maria) 

DESESPERO

Por amar demais, assim, tornou-se clichê o meu amor.
E se por amar demais a tua carne, ébria e sumarenta
Que emana dos poros o puro amor do inverno
Traz-me o verão, e as outras estações do ano
Para amar e usurpar o espaço que era destinado à razão.

E o meu calculo mental perdeu-se na amplidão de meus neurônios
Que, por motivo algum, eram de ferro. Minha mente prodigiosa
Minha mente vertiginosa se fazia sol e nuvem ao mesmo tempo.

Mesmo que eu necessite de companhia para um vinho
E que desse vinho tiremos ideias para um futuro livro
E que desse tempo tiremos formas para uma pintura
A nossa vida, unida pelas notas dessa partitura, seria
A coisa mais fabulosa desse mundo. Perdidos eternamente
Na consciência de uma molécula de desespero.


(28/07/2013 – Santa Maria)

terça-feira, 23 de julho de 2013

O TEMPLO

Poesia misturada, no inverno, a goles de vinho.
Poesia nua, em minha frente, convidando-me a uma orgia.
Poesia sendo poesia, mas deixando de ser parte da minha alma
Para ser externa, assim ela
Se fragmenta.
Poesia, ó Poesia, sejas minha fonte de vida
Minha mundana respiração. Sejas, também, minha amante despreocupada
Nessa orgia carnal chamada aurora.

Poesia

Ó loucura sadia de minha lucidez mórbida.
Ó sabor amarelado da luz do dia.
Poesia sendo Poesia, embora deixe
De ser o prazer secundário de minha carne
Para ser o prazer primeiro das minhas vísceras
Misturada ao meu plasma, sendo o meu alimento.
Poesia madura e pronta para ser saboreada.

Poesia minha
És a flor do meu canteiro, jardim da lua.
És, também, a magia das minhas mulheres
A cor do incolor, o sabor do insípido, a perfeição do imperfeito
A fome do meu metabolismo. És, ainda mais, a loucura do meu raciocínio.

Paixão

Quando te vejo na Poesia, sinto-me morrendo aos poucos
Doido de vontade, sem medo dos vermes
Sem medo da ligação extrema do mundo e do meu espírito.

Quando durmo, nos sonhos, sinto-me levitar
Mas, quando acordado, a Poesia me leva além da alma
Além da vida que conhecemos.
Com a Poesia sinto, mas, de modo profano
Sinto o leve toque da mão de Deus.

(22/07/2013 – Santa Maria)

quinta-feira, 18 de julho de 2013

VIDA POÉTICA DE UM LOUCO

Foi o que me disseram... Que em matéria de poesia
Minha vida era gasta e nula, e a labuta pelo pão era somente
Juntando calos nas mãos... E os cabelos brancos sumidos
São marcas da experiência? Loção para a queda em sua excelência.

Sim, foi o que me disseram, mas eu, escravo das palavras
Enxoto o corvo vil, de minha janela. Bendigo o amor, sim
Eu quero vida, vida para ser vivida, vida para ser regada
Vida cheia de formas, ondas, vida madura ou adolescente
A vida numa paródia às peças antigas, vida sendo apreendida
E por momentos futuros, em minha forma, sendo libertada.

Eu quero mesmo a vida, a vida que seja da gente.

Vida vendo o céu nublado. Vida vendo o céu caindo.
Vida ouvindo o cheiro de terra molhada chegando mais perto.
Vida dos moleques da rua. Vida dos viventes do cais do porto.
Vida, meu Deus, vida: firme frouxa larga estreita alta baixa...

Mas foi o que me disseram, e eu nego essa excrescência.
Nego a forma vil com que têm me oprimido a poesia.
Afirmo aos céus a luta pelo pão, não necessariamente
Adquirido com calos nas mãos. A luta pela sobrevivência na sela de pedra
A luta pela sobrevivência nos lobos cerebrais, a luta dos neurônios
Pela ideia mais fantástica, pela ideia mais complexa em matéria de poesia.


(18/07/2013 – Santa Maria)

quarta-feira, 17 de julho de 2013

PRESENTE NO ÓCIO

Se por vontade própria eu abdicar do meu emprego
E por razões mil esquecer o meu futuro
Sim, introduzirei um novo tempo em minha vida
Dedicar-me-ei ao tempo presente. Nunca mais Passado!
Até quando vier, meu Futuro!

E quando a dor estiver sufocando o meu coração.
E quando a saudade alucinar o meu cérebro.
Instintivamente negarei o meu corpo
E assumirei a minha forma de vagabundo
Abdicando uma vida
E entregando-me ao ócio.

E esse ócio momentâneo e cru
Quando ele, em minha vida, não tiver mais sentido:
O que fazer se de minha vida nada mais tenho?
Negar o que, quando o presente se fizer passado?
Negar o futuro? Mesmo que distante esteja ele
Mesmo que a minha vida esteja enlaçada por fios metálicos
Meu corpo nu em meio ao tempo
Nu na chuva, eu ganirei diante do meu Futuro:
“Meu tempo é o Agora. O Presente é minha sina.
Em minha vida mais loucuras, sem morte e muito mais amores!”


(17/07/2013 – Santa Maria)

sexta-feira, 12 de julho de 2013

GLÁUCIA, AMOR

Mesmo quando Neruda não fizer mais sentido.
Mesmo quando Quintana não mudar meu humor.
Mesmo quando Vinicius não estimular a libido.
Mesmo quando Hilda não cantar a minha vida.
Mesmo quando os poetas não cantarem a canção
Não deixarei do amor, sonhando. Não deixarei a sina
Me tomar conta. Vou de encontro às rochas
Sulcando-as. Cavando túneis de anelídeos
Por entre as rachaduras do solo. E nem menos
Por isso, deixarei de tocar a flauta, cantar amores
E com Gláucia amar debaixo d’árvore sobre a relva.

E mesmo que as cantigas da formosa flauta
Sucumbirem, o meu céu será glauco, assim de nuvens
Cândidas recheado. Onde o meu olhar em ti, Gláucia
Depositará a agudeza do desejo. Mesmo que a relva esteja úmida
Venha Gláucia, amar o amor em mim! Depositar afeto!
Eu sei e, até mesmo tu sabes Gláucia, que nos amamos
E do amor, sim, venhamos provar. Pois da vida
O que nos resta se não o campo e as ovelhas?
Se não a tranquilidade de uma vida serena? Então
Depois do amor, cantemos... E o sopro do vento nos trará
O fino perfume das flores nobres: as rosas e as tulipas.


(12/07/2013 – Ijuí)

quinta-feira, 11 de julho de 2013

PEQUENAS COISAS

Desmitifica a palavra
Verbo rochedo corda
Desmitifica.

Se o ressoar do som da tua voz
Compensasse o vazio do meu peito
E camuflasse a solidão dura da pedra
Assim como sulcam o pensamento
A minha voz misturada a tua seria
Pó trovão confusão seria amor, talvez.

Desmitifica o som
Canto canção nota
Desmitifica.

Assim como cantar o verbo diante do nada
E a tua palavra se faz completude em meu momento
Canta as vozes das aves
E me digas os ensinamentos do tempo
Já que a vida é passageira.
Confio em ti, e assim gorjeio.


(11/07/2013 – Santa Maria)

NOTURNO

Perfuro... Penetro o silêncio
Sulcando-o.
O insípido silêncio de minha sala
Misturado ao negrume de uma noite densa
Ouvindo a boa sinfonia dos grilos, rabiscando sentidos
Que se tornariam poemas, melodias.

            E o relinchar de um equino
            No terreno baldio aqui ao lado.
            Busco angustiado o meu perfumado silêncio
Se nada me detém, algo me convém, eu vou à luta.

                        E o olfato líquido de meus felinos
Presos aos seus faros, um girassol
                        Meus pés descansam
                        Enquanto a mão trabalha
                        E o corpo prova do vinho.


(11/07/2013 – Santa Maria)

domingo, 7 de julho de 2013

SONO

A fluidez do objeto
            Fluido
            Cartilaginoso
Objeto quase negro
            Pardo
            Branco
A casca da noz
            Nó
            Podridão
E as bananas no cacho
            Apodrecem
Os filhos
            Crescem
Quando o mundo
            Dorme


(06/07/2013 – Ijuí)

sábado, 6 de julho de 2013

UM GATO AO AVESSO

O gato, por dentro da paisagem.
Seria um gato marcado, a marca da desfiguração?
Um gato, por assim dizer, maleado
Um gato tingido, partido.
Esse meu gato, por dentro da realidade
Esse meu gato instantâneo e puro
Meu Deus, ele era a minha poesia!


(06/07/2013 – Ijuí)

quinta-feira, 4 de julho de 2013

AO POETA MORTO

Se dizer, fosse preciso, ao poeta morto
As palavras salobras de lágrimas derramadas
Mares negros, assim como reflexo de temporais.
Se dizer, fosse preciso, ao poeta morto
Redizer, ramificar o verbo, flexões abdominais
Lacunas do dorso, nós nas vértebras rompidas
Uma vida, dita assim, pútrida, que não poderia ser
Mas que na sina, os monstros ébrios do limbo
Obrigam à força sobre-humana mesquinhamente de ser.

E se o canto do poeta morto maldizer o estudo
E o colosso chamado Tempo – amigo íntimo da Morte –
Que por movimentos rotatórios, um pêndulo de relógio
Desmitifica uma imagem de metal precioso.
Desconheço as formas brutas de se dizer Amigo
Pois do bálsamo negro, com odor de sangue podre, coagulado
Jogarás por sobre as cristas das ondas da poesia.
Não se desgoste da vida, tu mesmo, que amanhã
Ao fim da tarde o punhal estreito, fincado em ardências
Na minha carne, lamentará a morte do poeta.
Pude ver, então, o quão dissimulada é a vida

Se de aparências e maquiagem mórbida o poeta se fez morto.

(04/07/2013 – Ijuí)

terça-feira, 2 de julho de 2013

OSSOS

É com gozo que recebeste o júbilo, Amada
E com tal zelo aparecera em minha janela
Com uma caixa de bombons, sendo que
Em posição machista, eu quem deveria
Presentear-te com bombons. Machismo.

As muitas comparações que existem para o teu sorriso
Para as cores das tuas borboletas no estomago
Quando nos vemos, não são e nem nunca serão
Meras figuras de linguagem
Simplesmente usadas para enriquecer de beleza
E complexidade o texto. As carapaças rígidas do foco
Um machismo urbano e coloquial.

Embora seja a poesia uma arte linda e dificílima
A matéria viva do poeta
Em poucos se ressalta a vida poética da alma.

Acreditamos ser a luz rápida e eficaz,
Assim a vida o é também... Então Vivamos.

É com enorme gozo, Amada, que recebeste o júbilo
E com isso regozijo-me na calada da noite
À procura de paz interior e loucuras na cama
Já que a loucura da morte espreita a casa
Sendo ela o resto de um esqueleto já poroso
Que não suporta o peso tal de sua foice
A morte fraca, de outras eras, era um dia
E hoje, com certeza não é mais.


(02/07/2013 – Santa Maria)

A COLHEITA

O som nefasto destas correntes que gemem
E suplicam abrigo em meus pulsos
Sangrentos. De ouvir o orvalho nas folhas
Figura tranquilizadora, enquanto os vermes
Rastejam em minha direção, imaginando
Que a morte já havia me possuído.

Sei que na noite fria, escura e remota
Das minhas pousadas tão singelas
Pude ver que a foice estreita ali estava
Junto de sua mestra tão negra e seca.

E que ainda o pecado mortal que me possuíra
Tomara para si a minha vida. Embaça os vidros.
Ofusca a luz.Traduz as minhas raízes.
Destrói o brasão de minha família.
Só não sei para onde me levará, ó morte certa

Que de supetão retoma o baile
Nada na minha forma líquida de ectoplasma.
E que o viscoso sangue negro
Que dos meus pulsos escorria, analisei
E percebi o mal que eu plantei. Isso resume
O trago de tragédia que bebi
E a pestilenta sina que agora colho.


(30/06/2013 – Ijuí)