quinta-feira, 29 de setembro de 2016

vejo
















vejo
muito mais, além
de um par de olhos
neste teu rosto
florido;
a tua boca, minha poesia
sumarenta;
e hei de
cantar os cantos,
e
hei de
tocar a lira
para, na densidade da noite,
usar do verbo-corpo que
delira.


(29/09/2016 – Ijuí)

incompreendidos
















é licito me dizer que amor não há
e mesmo que o passar dos dias,
o avançar das horas, longas horas,
em deferimento de minhas barbas longas
o inverno há de passar e com ele as lembranças.

ser feito fogo que se apaga,
o peito em brasa que se esfria.

o inverno há de passar e com ele a saudade.
o esquecimento é bom proveito
ele lhe tira aquilo que nunca lhe pertenceu.

é licito dizer que a vida avança
e mesmo que não se entre na dança
a música não se repetirá,
e o refrão uníssono ao espetáculo do auditório
mostrará que o devaneio é um meio artístico;

proferir a dança deduz-se um par,
mas eu não danço, eu nunca dancei,
apenas tive ensinamentos de violino e piano,
quando o divertimento era o violão e a guitarra.

o inverno há de passar e com ele a melancolia.
melancólico é o pensamento quando lembra os lábios teus,
quando em sonho se põe a tocar a tua tez,
quando desperto tocaria teu peito com meu peito
e sentiria o profano pulsar do coração medonho.

hoje posso dizer que não vivi.
nunca vivi. sou apenas o eco seco gritado
ao fundo de uma caverna, um eco só,
fatigado e rude que nada diz
apenas sente a solidão úmida do esticado tempo.

o tempo que traz de si o som do nosso fim.
— “temos alguma reação a isso?... temos modo de reagir?”
já disse Bandeira: — “não. a única coisa a fazer é tocar um tango argentino”.
triste fim para quem ama, bom começo para quem raciocina.

(24/08/2016 – Ijuí)

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

a plenitude














a plenitude exasperada
pelo escapismo do intelecto
somos vistos como seres
quando o que realmente somos
é o nada que plaina involuntário
sangue que se escorre de ferida aberta
vozes cravadas na carapaça
óssea do tempo que foi e que virá.


(12/09/2016 – Ijuí)