domingo, 21 de dezembro de 2014

DO VAZIO

Tem vezes que me sinto
estar imerso em um enorme vazio,
e este vazio é o meu elemento preferido.

Que vazio era este
que manipulava meus sentidos,
burilava meus ouvidos
e era um vazio, somente!

Mas que tenho eu de coisas cheias?
Minha mente plena é sonolenta,
meus risos são ritmados pelo silêncio,
e minha razão é nunca ter razão, e ainda
que eu trilhe por entre as sombras
meu coração será o sol na trilha.

Minha vida é constelação.

Nadando ao mar
e andando entre o arvoredo
meu ser estará sendo eternamente...

... eternamente ruminado!


(21/12/2014 – Ijuí)

sábado, 13 de dezembro de 2014

NOITES E DIAS

Aquele sopro de realidade translúcida do corpo,
Que invade a retina nebulosa,
Não parece tão real quanto à vertigem
De um delírio confluído e materializado.

Se, à noite, as luzes apagam
E em meus ouvidos zombam de mim
E dizem-me que na travessia da rua deva me atirar,
Atirar-me para debaixo de um automóvel que busca
Um corpo instável para colisão.

Se de noite caminho na escuridão de meu quarto,
E o burilar do vento à janela pressentindo o temporal
Ouço vozes a sussurrar em meus ouvidos
Dizendo-me coisas perdidas, incompletas e purulentas
Não cabendo mais em mim tanto tormento

Para depois cair do patamar noturno
E ser perseguido pela ilusão o dia inteiro.


(13/12/2014 – Ijuí)

É O RISO A EXPRESSÃO

É o riso a expressão
fora do controle (momentânea),
riso abrupto de pureza sonolenta:
dizendo estarmos dentro
da noite aberta.

O cálculo fiel da conta do bar.

Os “beats” dentro de um fusca alucinado
rodando estrada afora,
e nada do que se diga poderá ser maior
do que o sangue que corre em nossas veias abertas
naufragadas de sentidos.

O líquido, a cor, a noite densa:
é por isso que somos assim,
por estarmos em constante sintonia
com o universo
e as estrelas.

É o riso a expressão.

(13/12/2014 – Ijuí)

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

AS CARAVELAS

No comando do leme está
o Capitão e sua corja.
Não detenho maremotos com os dedos,
mas por eles se escorrem grãos de areia.

Labutando o divino sopro da ventura,
a aurora boreal no Pampa Gaúcho,
minha vida indistinta se fazendo em lágrimas,
de contentamento estou completo...

Cabem, em mim, as maravilhas do orgasmo
abrupto da carne que sangra o ódio,
e no fogoso momento de coito alucinado
o corpo morre nunca mais tendo estado.

Mas que tenho eu de maravilhoso e belo?

Tenho mais de jubiloso e simples.
Humildemente digo-lhe:
“As caravelas de Cabral se estão perdidas
por terem desposado a carne pura.”


(10/11/2014 – Santa Maria)

quinta-feira, 30 de outubro de 2014

CORAÇÃO OCO

Não é para tanto
que meu coração oco...
... frutificou.

Nem é maior espanto
nele permanecer
o amor prematuro.

Mas sabemos
que a vida é ferrenha
e a morte se achega:

estando minha casa
debaixo do céu,
debaixo das asas.

Minhas semeaduras
estão brotando
e nisso percebo

que meu coração oco
agora, ainda mais um pouco...
... frutificou.


(29/10/2014 – Santa Maria)

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

ESTRUTURA

Se de nenhuma paisagem
é formado nosso ser
que tenho eu de borboletas?
Mas cansa-me a mão;
já não sirvo mais pra ser
em estado físico.
Sou etéreo,
nuvem;
refiz-me da carne em poesia.


(22/10/2014 – Ijuí)

O BEIJO DE AMOR

E a beleza encantadora:
eu a tenho
empenhada no seio.

Aberto o peito,
retenho o silvo
de um sussurro encantador;
nada do que outro silvo
por ser sobre amor
o tema do filme.

E a beleza encantadora:
eu a suponho
lucidamente em meu crânio.

No que o amor estiver
serei adepto do canibalismo
metafísico da dor.
Posto que ame:
num dia se apanha,
noutro se ganha.

Mas sabe-se agora
que o amor demora,
que a profanação da boca
é cerrada com um beijo.

Não tenho receio
de dizer bobagens.
— “Se tenho medo?”
É por molecagem
de dizer anedota.
Abrimos as portas
e: “Viva o mundo!”

E a beleza encantadora
tenho na vida amadora
de ser um tanto que estranho,
reter na boca o beijo cálido,
perder a cor do estado gélido
e derreter como o gelo no fogo.

Tudo isso num beijo de amor...


(22/10/2014 – Ijuí)

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

O MAR

Navegar eu vou:
em toda euforia.
Navegar eu vou:
nesta poesia.

Se me tenho empenhado
neste meu “lar” tão amado
com este mar jubiloso:
lembro, e me cubro de gozo.

Navegar eu vou:
no mar, minha vida.
Navegar eu vou:
nestas redondilhas.

Navego. E embora o momento
ser de chuva e de vento:
este meu “lar” é garboso,
calmo, poético e airoso.

Navegar eu vou,
eu vou à Bahia.
Navegar eu vou:
nesta maresia.


(27/09/2014 – Ijuí)

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

MENINICE

Canto dos pássaros; o jardim
com suas cantigas de roda
para balançar minha alma.
Ah! tempos de eu menino...

E desses cantos agora
vejo a meninada a jogar bola,
o vozerio dessas crianças
e meninas a fazer tranças...

Mas nada de meu eu tenho,
apenas recordações frustradas:
por trás de mim, uma estrada
que nunca mais será percorrida...


(22/09/2014 – Santa Maria)

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

MAMUTES ANDRÓGINOS

Mamutes andróginos e puritanos,
compadecidos de tal dor humana e desgastante,
pude ver ao meu par um ser mutante
que naufragou na graça, eternamente.

Cadência de cores, um prisma alucinado
caindo ao chão. Pórtico da casa. Telhado.
E não era mais meu este desejo vil
subindo ao céu estrelado, azul, anil.

Cintilam as estrelas, portas abertas
dando ao vão da escada um tanto incerta,
mas meditando vou ao teu encontro agudo
beijando as mãos molhadas, um livro aberto.

Contigo: as mãos molhadas, um livro aberto;
anunciando a minha chegada, (eu descoberto),
vai gritando, o porta-voz, mamute andrógino
compadecido de tal dor humana, porém sereno.

Sabe-se lá o que da vida posso ter contigo:
lar, morada camarada, cães ladrando;
nas sextas-feiras: sair e beber com os amigos,
nos sábados e domingos: casa e filhos.

Porém, amor, teremos casa? Amigos?
Filhos nós teríamos? Depois, na noite,
beijarmo-nos eternamente. Amor, indago:
se poderíamos fazê-los até a meia-noite?

Mas na casa, a cama é quente, seda viva
são os lençóis. Caberá no quarto o meu roupeiro?
A sapateira? Terá a casa um cômodo estreito
para meus papéis avulsos e a escrivaninha?

Amor, a vida passa. Cai a noite em meu mundinho.
Vai-se de mim a brasa do dia; entra caladinho
o meu desejo de te ver, além-vida, na labuta
de nunca te deixar. Amar-te: aqui essa é a luta.

(22/08/2014 – Ijuí)

segunda-feira, 11 de agosto de 2014

MINH’ALMA

Minh’alma tem voz,
ela canta com doçura; vocifera a agonia,
e, pela última vez, cantará aos céus o seu lamento —

porém, não é do meu sumo a tua aflição,
nem do meu pranto a tua fina canção.

Cantai. Oh! cantai, meu denso peito receoso,

minha pura voz, constante e bela:
com mais afã e menos glória;
serenidade da alma em meio ao oceano
de vozes e gritos do poente ao nascente.

Minh’alma grita o pranto

de não ser, então, mortal.

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

REMANSO

Fazia-se algo intacto
o meu poema estagnado... (Duas palavras).

Se da alma brotasse a alva flor da paz,
e o meu cubículo se enchesse de luz serena

minha dádiva da vida seria apenas
a bela aurora, o clarear do dia.

Mas era meu aquele broto de viva flor
flutuando na imensidão retida de um poema bucólico?

Pude ver que não era mais meu,
e sim do Mundo,

com esta malfadada forma lírica de vida:
amanhecer e não reter a luz;

nadar às letras e nunca mais...
Faço desse poema o Nunca Mais

para decantar o outro lado
e descobrir, no vazio do entremeio,

a face incolor daquele Outro
que navega no líquido da aridez deste espaço sem matéria

em que meu corpo estará inerte,
sem fadiga alguma, perante o Rei dos poemas mortos.

Sobressaindo-me em duas palavras...

(04/08/2014 – Ijuí)

quarta-feira, 30 de julho de 2014

DUALIDADE

Se dissesses a mim que o humano se faz ordem,
e que a casa é nossa:
eu deveria crer?

Se a manhã transpassa a claridade para minha cama
(para o meu lado da cama;
para a dita cama que supostamente é nossa)
eu deveria ver o teu corpo nu entre o lençol de seda?

O incompossível de minh’alma
na luta noturna entre os corpos
fazendo ordem direta do querer permanecer;

e a labuta corriqueira se tingindo de negra
para me abastecer a pura essência com menos cores.

Se dissesses a mim que o meu passo iguala-se ao seu
eu deveria crer?

Se no cotidiano, ao café da manhã,
derramasses em minha camisa branca
uma xícara de café:
eu não explodiria de raiva?

A luta árdua de nossos corpos
ligados por algo inexplicável, inexprimível.


(15/07/2014 – Ijuí)

sábado, 5 de julho de 2014

ASSASSINO

Como trilho o mundo?
Caminhando vou ao meu fim
por me ver no Amor em ato profano
de bendizer o mal que há em mim.

Sem nada de mais,
vou amando e assim dilacerando a alma:

cabisbaixa,
irrequieta,
sangrenta.

Por ter do Amor tirado o sumo:
este afinado veneno do corpo humano;

e nada, nem ninguém deporão contra mim
o ato profano de um Amor visceral
por tê-lo eu vivido outrora
negando minha vida pela dela
e destruindo, em mim, minha própria alma.

Diz-se celeste esta podridão que habita a Terra!
A mão que agora afaga, virá a atirar pedras;
se na roseira há belezas: os espinhos também são dela;
e do Amor, que tenho eu, senão ferida aberta?

Do Amor que me cativa
é a Morte certa nesta vida.
Nego o Amor. Sempre o negarei para assumir a história
de estar preso e sem ação

incendiando ainda mais esta canção profana.


(05/07/2014 – São Paulo)

sexta-feira, 27 de junho de 2014

PRESSÁGIO

Pergunto a ti, depois de crido,
onde é que mora o Desejo?
Responde-me, anunciando alto,
que vácuo agudo é a sua morada.
Mora o Desejo, também, na confluência do ocaso,
perdido e vago, nas andanças amargas da vida!

Se por além do muro vejo um rato:
bestializado (objeto místico)
ser retratado e musicalizado.
Além do muro serei eu um rato sujo.

Mas a causa maior desta vida alheia;
a Morte em casa descansa os pés num banco
por estar, de leito em leito,
buscando a alma deles — dos outros —
e a mim irá buscar, no além-mar,
(candura e música), quando me fizer
estar completo, repleto de paixões mundanas,

sem mais ter por onde navegar na manhã fria.


(27/06/2014 – Ijuí)

quinta-feira, 26 de junho de 2014

NUDEZ

São marcas da vida e de amor
em minhas lascas, couraça humana,
candura temporária de tempero e hortaliças.

As marcas de dentadas, com resquícios de sangue
escarlate, ora vertia ouro líquido:
agora é apenas piche o que outrora
ardia lava incandescida em minhas veias.

E do terreno vertiginoso,
ao alto da montanha branca,
a neve derretendo por sob meus pés:
nada poderá fazê-la congelar em meu corpo
jubiloso, tenro, sumarento.

Além dos canaviais do nordeste,
às plantações de trigo, ali pelo sul:
sou todo arrepios doentios.

Pois, tendo tudo isso em mim estado,
nunca gritei angústias malfadadas.
Agora arranco meus cabelos rarefeitos
para despir meu corpo nessas verdades.

(25/06/2014 – Ijuí)

quarta-feira, 28 de maio de 2014

CÁRCERE

Abro as janelas de minha alma
que estava em frestas
(arestas encarnadas que flamejam o fogo da virilidade;
janelas de meu cubículo trancafiado
na masmorra da mente;
ao sol exposto meu corpo sangra
a rubra hemorragia verbo-visceral).

Sou pura vítima do algoz sofrimento
de meu ultrarromantismo,
e minhas ardências são manifestas
por uivos e latidos contidos no nada.
Nada mais se faz em sentido
o que outrora sentido se fazia.
Mesmo eu estando dentro e fora de mim
ao mesmo instante,
perto, até mesmo, do fim da vida.

Um comprimido jogado ao fundo da faringe.

Cativaste-me por todo tempo que há de ter o mundo,
E, com isso, ululei vigílias solitárias e rarefeitas
dentro de uma choupana desfigurada.
Meticulosamente naveguei o mar
das incertezas cativas em meu peito esquálido.
Subi penhascos sem ter exímio equipamento
e nem mesmo tive medo de repentina queda.
E nada, nada: se não por milagre
poderia ter me levado para mais alto
perto do firmamento, lar do teu porvir.
Milagre teu, sim, teu, Musa Angelical,
que, posta ao pedestal, ali sempre permanecerá.
E sei bem que tu, Anjo de Deus, és pura:
pura para mim que da terra sou composto
em corpo e em alma.

Bem sei, eu, que mortal pecado seria pedir ao poeta
de impar sapiência ornamental:
que se faça terra vil o que do céu brumoso é feito
em repentinas passeatas angelicais.
E que celeste seja feito o que de terra profana se tem feito
ao meio-dia na torrente insólita de sol.
Isso tudo te peço, poeta, por ser o meu amor
o que humano é feito e é contido nele.

Neste último suspiro agoniado brado
neste mundo essa blasfêmia por entre os dentes
que rangem até o sangue jorrar das gengivas escarlates.


(28/05/2014 – Ijuí)

quinta-feira, 22 de maio de 2014

FLAUTA TRANSVERSAL

Não deixo meu fogo morrer,
pois dessa vida muito já se apaga:
são, por trás do mato, as pegadas;
são, durante as noites, as vigílias.

Tudo cai ao esquecimento.

Não deixo minha vida findar.
Caibo dentro do som, o cantar:
canto da vida o som secular
dos meus poros, às últimas moléculas.

Não é de o sopro o raiar.

Minha rústica serenata de amor
não cabe dentro dos ramos de flor.
Minha seresta vertiginosa numa flauta
sibilando, os versos sonoros, o coro ao redor.

Minha vida é o eterno passar, mas
o que fica é o perpétuo anseio de existir.

E, por cá, chamo teu nome
(denúncia do chamamento de outrora)
quando o corpo sonha com o que nunca teve.
Nem mesmo o tem no tempo de agora.

Mas há de se saber tudo, em breve.
O alento da alma, uma poção lunar,
em que o corpo se entrega à moléstia
de dormir, depois da vida, ao raiar:

e de cada verso meu, fazendo o ciciar
do que não coube ao tempo provar
as notas da flauta que o sopro da noite

nunca soube tocar.

(22/05/2014 – Ijuí)

terça-feira, 13 de maio de 2014

NEUROSES

Manipulo meus neurônios retorcidos,
abdicados de seus afazeres para brincarem
sem ter o que reivindicarem na assembleia.

Meus pares abandonaram-me,

caí em desuso nessa humana ladradura:
cartilha cartilaginosa, eletrificada,
mitificada pelo inexplicável do órgão.

Meus pares hostilizam-me

nessa candura de momentos infinitos
que nunca caberão no átimo momento das sinapses,
mas que moverão o corpo todo

no transluzir do líquido cefalorraquidiano.


(13/05/2014 – Santa Maria)