domingo, 8 de setembro de 2013

LIBERDADE

Passa
A lâmina.
Passa.
Passa a lâmina.
Afia.
Corta.
Testa.
Verifica.
Sabe-se
O que?
Vai
Passa a lâmina no esmeril
Fagulhas cintilantes caindo, voando da roda, a madeira
A madeira da mesa.
Testo a faca
Na madeira.
A mesa.
Tudo pronto
Em seu devido
Lugar.
A pele presta
Para tanta afiação.
O silêncio afinado da oficina muda
Claustrofóbica sensação de perder o controle.
Fito a janela
E lá de fora a árvore me fita
Vejamos: assim nos vemos de relance.
A seiva da árvore, subindo ao tronco, descendo ao solo
Assim como minha seiva a ser derramada
Colorida, rubra
O som das cores
Deformadas.
Desligo o motor do esmeril
Passo o fio da faca num fio de cabelo
Meu próprio cabelo para o teste.
Testo.
Ela corta
Afiada faca
Longa e firme.
Determinação.
Corpo em controle. Mente forte. Exatidão.
Tranco a porta
Saio ao pátio
Entro em casa
Vou ao banheiro
Tranco a porta
(Som nefasto da chave se passando).
Banheira
Cheia d’água
Corto os pulsos
Deito n’água
E vou morrendo lentamente
Vazando. Tingindo a água de vermelho
Sem saber o gosto da lâmina em meus pulsos.
Cortes fundos, nem percebi a dor.
Na liberdade
Lambo uma gota
De sangue e seu sabor
Como se bebesse vinho.

(08/09/2013 – Ijuí)

Um comentário:

  1. Poeta!
    Percebo que nestas últimas produções um lado tétrico e sombrio do teu lirismo.
    Ao meu ver algo que mexe com muito mitos e muito com nossa luta de sobrevivência.
    Desatino ou não.
    Inspiração ou não.
    Lutar contra o mal que as vezes está dentro de nós é que nos fazem VENCEDORES não entregues ao destino ao léu.
    Minha interpretação das últimas produções.
    Abraços
    Admirador

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